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Agente de Contratacao

Agente de Contratação: Segregação de Funções e as Atribuições

Afinal, qual a importância da segregação de funções para o controle das contratações públicas? A Lei nº 14.133/2021 preocupa-se com a segregação de funções, que foi alçada a princípio no art. 5º e está descrita no art. 7º como diretriz a ser observada na contratação.

“a autoridade máxima do órgão ou da entidade, ou a quem as normas de organização administrativa indicarem, deve proibir a designação do mesmo agente público para atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, de modo a reduzir a possibilidade de ocultação de erros e de ocorrência de fraudes na respectiva contratação”.

É sabido que esse princípio tem o objetivo de assegurar a divisão de trabalhos e individualização das atribuições, a fim de dar maior transparência e aprimorar o controle.

A Necessidade de Regulamentação dos Processos e Matriz de Responsabilidade

Para aplicabilidade plena desse preceito legal é necessário que as organizações regulamentem a sua matriz de responsabilidade, definam as competências e habilidades, estruturem as áreas e implementem processos de trabalho atuais e adequados.

A propósito, no âmbito federal, o Decreto nº 11.246/2022, estabeleceu quais são as atribuições do agente de contratação no processo licitatório. Vejamos:

Art. 14.  Caberá ao agente de contratação, em especial:

I – tomar decisões em prol da boa condução da licitação, dar impulso ao procedimento, inclusive por meio de demandas às áreas das unidades de contratações, descentralizadas ou não, para fins de saneamento da fase preparatória, caso necessário;

II – acompanhar os trâmites da licitação e promover diligências, se for o caso, para que o calendário de contratação de que trata o inciso III do caput do art. 11 do Decreto nº 10.947, de 25 de janeiro de 2022, seja cumprido, observado, ainda, o grau de prioridade da contratação; e

III – conduzir e coordenar a sessão pública da licitação e promover as seguintes ações:

  1. a) receber, examinar e decidir as impugnações e os pedidos de esclarecimentos ao edital e aos seus anexos e requisitar subsídios formais aos responsáveis pela elaboração desses documentos, caso necessário;
  2. b) verificar a conformidade da proposta mais bem classificada com os requisitos estabelecidos no edital;
  3. c) verificar e julgar as condições de habilitação;
  4. d) sanear erros ou falhas que não alterem a substância das propostas; e
  5. e) encaminhar à comissão de contratação, quando for o caso:
  6. os documentos de habilitação, caso se verifique a possibilidade de saneamento de erros ou de falhas que não alterem a substância dos documentos e a sua validade jurídica, conforme o disposto no § 1º do art. 64 da Lei nº 14.133, de 2021; e
  7. os documentos relativos aos procedimentos auxiliares previstos no art. 78 da Lei nº 14.133, de 2021;
  8. f) negociar, quando for o caso, condições mais vantajosas com o primeiro colocado;
  9. g) indicar o vencedor do certame;
  10. h) conduzir os trabalhos da equipe de apoio; e

i) encaminhar o processo instruído, após encerradas as fases de julgamento e de habilitação e exauridos os recursos administrativos, à autoridade superior para adjudicação e para homologação.

Dessa feita, o regulamento federal sistematiza as atribuições do agente de contratação e dá segurança jurídica para sua atuação, na medida em que define o que pode ou não fazer.

Ocorre que, quando não há essa regulamentação com a fixação das atribuições, conforme exige o artigo 8º da Lei nº 14.133/2021, as responsabilidades ficam desorganizadas e misturadas e um dos servidores que mais sofre com esse contexto sem rumo é o agente de contratação, que passa a assumir atribuições que não lhe pertence.

Sob essa perspectiva, temos vários acórdãos das Cortes de Contas considerando a irregularidade da atuação dos agentes de contratação em etapas, funções e atividades que fogem a sua alçada e violam de forma direta o princípio da segregação de funções.

Sobre o assunto, cite-se:

– Acórdão TCU nº 1.418/2019 – Primeira Câmara

  1. Conclusivamente, constatou-se que o responsável não somente atuou como pregoeiro do certame, mas, em evidente descompasso com o princípio da segregação de funções, também era o dirigente do setor responsável pela elaboração do edital e da pesquisa de preços, além de haver assinado, em conjunto com a área demandante, a solicitação de contratação com indicativo do valor estimado no montante de R$ 56.281.041,71.

A Participação do Agente de Contratação na Etapa de Planejamento da Contratação

Não obstante a fixação das competências e fluxos dos processos de trabalho, questão que se coloca é a participação do agente de contratação na etapa de planejamento das contratações.

Cumpre registrar que o agente de contratação é um elo estratégico na cadeia de suprimentos das organizações, tornando-se um elemento-chave para o alcance das estratégias de negócio. A colaboração do agente de contratação com a fase preparatória é vital para o resultado positivo das contratações, visto que o êxito da licitação está umbilicalmente ligado a fase de deflagração do processo licitatório.

Desse modo, é importante que o agente de contratação tenha conhecimento aprofundado sobre os temas de contratação e habilidades adequadas para atuar nessa função tão importante e estratégica das organizações.

O Tribunal de Contas da União, em desfecho desse entendimento de buscar profissionais para atuar como agente de contratação com conhecimento abrangente e habilidades, assim decidiu:

O fato de não constar menção a item específico do edital infringido pelo pregoeiro não inviabiliza a audiência do responsável, tendo em vista que a sua conduta não deve obedecer apenas ao que está disposto no edital, mas sim a todo o arcabouço jurídico que fundamenta as regras editalícias, tais como a Lei 8.666/1993 e o Decreto 7.170/2010. (Acórdão TCU n° 3.059/2020)

Por todo o exposto, restar claro que o agente de contratação deve ter uma atuação proativa e zelar pelo bom fluxo da licitação.

Não obstante, a necessidade da colaboração do agente de contratação com a fases da contratação, assunto que se questiona diz respeito a possível violação ao princípio da segregação de funções com a sua participação na fase preparatória.

Observa-se que o agente de contratação colabora com a etapa de preparação, que se apresenta como essencial para o trâmite do processo licitatório, mas não lhe é permitido tomar decisão e participar da equipe de planejamento.

A finalidade dessa interação do agente com os participantes da feitura dos artefatos da fase preparatória é permitir que ele compreenda bem o que vai ser contratado e realize uma boa compra. Para além dessa função, há uma dinâmica prévia e colaborativa de conhecimento da pesquisa de mercado, previsão orçamentária, requisitos, documentos exigidos, a fim de evitar incidentes no certame.

Sobre o assunto, cabe lembrar o trecho do voto condutor do Acórdão 1.278/20 – Primeira Câmara do TCU:

e) houve violação ao princípio da segregação de funções, haja vista que servidores que participaram da Equipe de Planejamento da contratação, também desempenharam funções de Membro de Equipe de Apoio e de Pregoeiro da licitação (…);

Desse modo, resta claro que o agente de contratação não participa da equipe de planejamento. Ele apenas colabora, apoia e executa atividades para o bom andamento do certame. Afinal de contas “segregar não é isolar”. Destaque-se, neste momento, a disposição do Decreto federal nº 11.246/2022, no sentido de que a segregação de funções será avaliada na situação fática processual e poderá ser ajustada, em cada processo, levando em consideração a consolidação das linhas de defesa e as características do caso concreto, como o valor, eventualmente baixo, do objeto e sua complexidade. Não se pode esquecer que, em diversas situações, o órgão/entidade envolvido não possui um quantitativo de pessoal suficiente para aplicar, na sua plenitude, o princípio da segregação. Em situações como essa, recomenda-se a justificativa formal nos autos do processo respectivo, para evitar questionamentos dos órgãos de controle.

Artigo escrito por:

Paulo Sérgio de Monteiro Reis: Engenheiro Civil e Advogado, Membro Fundador do Instituto Nacional da Contratação Pública, palestrante, autor e coautor de diversas obras no tema licitações e contratos da administração Pública.

Tatiana Martins da Costa Camarão: Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1993) e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1997), Vice-presidente do Instituto Mineiro de Direito Administrativo – IMDA, professora da pós-graduação da PUC/MG. Palestrante e instrutora de cursos de capacitação.

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